“A armadilha” é uma das narrativas mais enigmáticas de Murilo Rubião. Construída com base na ambigüidade e no suspense, ela desconstrói os esquemas da lógica do senso comum, instaurando, desde o seu início, a incerteza própria do gênero fantástico. A personagem Alexandre Saldanha Ribeiro, mesmo carregando uma mala pesada, rejeita o elevador e usa as escadas para chegar ao décimo andar de um prédio desabitado, sujo e decadente. Ao entrar na sala que buscava, uma grande surpresa o aguarda: um velho está a sua espera empunhando um revolver na sua direção. Este fato inesperado gera no leitor a justificada expectativa de que Alexandre seria assassinado.
Isto não é o que ocorre, mas sim um inusitado diálogo entre o velho e Alexandre, iniciado pelo velho: “... esperava a sua vinda. Há dois anos, desta cadeira, na mesma posição em que me encontro, aguardava-o certo de que você viria.” A partir daí, uma seqüência de fatos inverossímeis vão se sucedendo, instaurando a incerteza que caracteriza as narrativas "fantásticas", nas quais o elemento “misterioso” intervém no curso normal dos fatos, resultando em uma ruptura, em um “suspense” instigantes: a arma descarregada, as janelas fechadas com tela metálica, a porta de aço trancada eliminando qualquer possibilidade de fuga para Alexandre, tirando-lhe a chance de escapar à situação de prisioneiro, de vítima de uma armadilha, na qual ficará para sempre: “Aqui ficaremos, um ano, dez, cem ou mil anos.”
O desvendamento do mistério não ocorre no final do conto. A ambigüidade permanece até o final da história, deixando que o leitor faça a dedução dos fatos finais.
Em “A Armadilha”, nenhuma explicação é dada aos fatos estranhos e o final da história é inconcluso e ambíguo. Todavia, não estamos diante de um texto que pretende ser mera diversão ou passa tempo vazio de significado.
Como costuma acontecer nas obras murilianas, este conto veicula uma crítica de cunho moralizante à realidade do mundo contemporâneo. Suas personagens tipificam a condição absurda em que vive o homem, prisioneiro de uma sociedade na qual imperam a incomunicabilidade e a solidão, como inapelável conseqüências da existência humana.
Um comentário:
tempos atrás critiquei sua resenha acerca do conto. Desculpe-me por isso, estava em um momento de extrema irritação durante a pesquisa e, na verdade, seu texto me ajudou muito nela, eu que fui estúpido e não compreendi o texto logo na primeira leitura. Mais uma vez, desculpe-me e obrigado.
Postar um comentário